O Brasil todo tem 153.666 pessoas que fazem parte dos 0,1% dos mais ricos do país, com uma renda média mensal de R$ 441.290 mil. As cifras de ganhos mensais variam de estado para estado. São Paulo, por exemplo, é o local onde vivem os mais ricos desses riscos, um total de 48.822 pessoas, com ganho médio mensal de R$ 582.572 mil. Desse percentual mínimo, porém milionário, vivem no Rio Grande do Norte 1.570 dessas pessoas, com renda média mensal de R$ 215.663 mil. Roraima, é o Estado com menos riquíssimos: 329 pessoas. Mas, a renda mensal deles, compensa: R$ 217.709 mil. A concentração de renda bateu recordes históricos nos últimos cinco anos no país.
Os dados foram coletados a partir das declarações do Imposto de Renda e divulgados na recente análise publicada no Observatório de Política Fiscal do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (IBRE/FGV), responsável por desenvolver estudos socioeconômicos, pesquisas, análises e diversos indicadores baseados no levantamento de dados econômicos, financeiros e empresariais. Entre as estatísticas econômicas produzidas pelo IBRE destacam-se os índices de preço e os indicadores de tendências e ciclos de negócio, de ampla utilização por estudiosos, analistas da economia brasileira e gestores na esfera pública e privada.
A Agência Saiba Mais conversou com o jornalista e economista responsável pela análise do IBRE/FGV, Sérgio Wulff Gobetti. Ele explicou que esses cálculos mostraram que a concentração de renda aumentou nos últimos cinco anos. Em sua Nota Técnica, Gobetti demonstra que a renda da elite, além de ter crescido bem acima da média da população brasileira, subiu ainda mais nos estados onde a economia é dominada pelo agronegócio. No Mato Grosso do Sul, por exemplo, a alta nominal foi de 204% (ou 131% em valores reais), no estrato social constituído pelo 0,01% mais rico. Houve um aumento de renda de 87%, entre 2017 e 2022, para a parcela que compõe os 0,1%.
Numa pesquisa rápida na internet é possível encontrar preços de produtos que só podem ser consumidos por esses milionários com renda de mais de R$ 215 mil mensais no Rio Grande do Norte. Em uma concessionária de carros de luxo de Natal, por exemplo, os preços variam entre R$ 784.050,00 a um veículo “mais em conta” no valor de R$ 429.000,00. Nessa mesma loja, uma arrumação no banco traseiro custa mais do que recebe um trabalhador de salário mínimo no mês: R$ 1.511,73. Mas, um cabide de banco (R$ 457,84) e um disco de freio (R$ 508,55) custam menos do que o valor médio da cesta básica no país, calculado em torno de R$ 702,00.
Valores para além da realidade de 99% da população também são encontrados nos custos de apartamentos de “alto padrão”. Com cifras de quase dois milhões de reais para um imóvel de luxo nos bairros de Tirol, Petrópolis, Areia Preta e Ponta Negra, encontrados em buscas nos sites das imobiliárias.
Gobetti esclarece que os cálculos – para não se correr o risco de serem mascarados – não foram baseados em ganhos reais e sim nos nominais, porque o aumento de renda da base da pirâmide mal encostou na inflação. E poderia se usar o argumento de que houve um aumento real na renda do trabalhador brasileiro. Além da benesses para o agronegócio, a isenção de impostos para dividendos é um outro fenômeno que explica essa concentração de riqueza que “bateu um novo recorde histórico” com aumento de 87% entre 2017 e 2022, para os que compõem os 0,1%. Vale explicar que, diferente de quem ganha salário, dividendo é tudo aquilo que é recebido, em forma de uma parcela do lucro apurado por uma sociedade anônima, que é distribuída entre os acionistas, geralmente uma vez por ano, por ocasião do encerramento do exercício social de um determinado período.
Há também uma outra distorção apontada pelo economista, que é o fato de que o Simples é um regime que acaba gerando uma confusão entre o porte da empresa e a capacidade produtiva do sócio.
“Por exemplo, pode haver um aposentado que seja acionista da Petrobras, que se beneficia da isenção de dividendos. Mas ele é um pequeno poupador de uma empresa milionária. Enquanto que pode existir um milionário dono de uma pequena ou micro-empresa. Grande parte dos donos das micro não são pobrezinhos. São pessoas muito ricas. E é a mesma pedagogia – de isenção de dividendos – que se dá ao mundo rural”, esclarece.
Jabuticaba tributária
A isenção de impostos para dividendos não uma prática só brasileira. Segundo o especialista, além daqui, havia no México, Grécia, Estônia e Letônia. Mas, Gobetti usou o termo “jabuticaba tributária” para explicar algumas coisas que só acontecem no Brasil, em termos de política financeira, as quais desde seus primeiros estudos, ele constata que só acontecem no Brasil.
“A reforma da tributação do consumo supera algumas dessas jabuticabas. O Brasil era um dos poucos países do mundo a tributar bens (ICMS) separadamente de serviços (ISS). Mas, mais importante que criar um tributo único, é criar uma tributação conjunta de bens e serviços e não haver mais a separação”, sugere.
Agora, é fato que a isenção de impostos para os dividendos faz parte das escolhas políticas do país. E esse tratamento favorece a classe dos hiper ricos. E alguém pode se perguntar, por que isso é ruim? Gobetti responde:
“Porque nos últimos anos, surpreendentemente, conseguimos ampliar esse grau de concentração; diferente de muitas décadas atrás, hoje eu diria que a desigualdade é um problema não só em termos de justiça (social) mas, além disso, é também o que a pesquisa econômica científica mostra: que países mais desiguais crescem menos; tem menos performance econômica”, afirma
E quando isso acontece, essa desigualdade afeta todo mundo, inclusive, as pessoas mais ricas. E, segundo ele, ainda são poucos os ricos brasileiros que têm criado uma consciência na importância de serem tributados.